Alienação Parental

  • Por Rose Meireles
  • 11 jun., 2019

O Direito à Convivência Familiar e a Alienação Parental

O direito à convivência familiar tem previsão constitucional no art. 227, caput, ao enunciar que “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão” (grifou-se). O direito à convivência familiar também se encontra no Estatuto da Criança e do Adolescente, como instrumento de garantia ao desenvolvimento integral da pessoa. Nesse diploma legislativo, trata-se do exercício da convivência familiar no âmbito da família natural e da família substituta. A convivência dos filhos com os pais, após a o fim da relação do casal é definida por meio do instituto da guarda, disciplinada no artigo 1.583 e seguintes do Código Civil.

Dentre as modalidades de guarda, o legislador confere a faculdade de se estabelecer a guarda unilateral ou compartilhada. Dispõe o § 2º do art. 1.584, que “quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor”. Significa dizer que tanto o consenso, quanto o dissenso, podem levar à guarda compartilhada. Presume-se que esse modelo de convivência familiar melhor atende ao interesse da criança, embora somente o caso concreto possa confirmar tal conclusão. A falta de consenso pode, de fato, prejudicar a guarda compartilhada como modelo que melhor atenda ao interesse da criança. Nesses casos, poderá o juiz decidir a convivência de modo diverso, estabelecendo a guarda unilateral a um dos pais ou deferir a guarda aos avós, por exemplo.

Independentemente da modalidade de guarda estabelecida, o direito à convivência familiar pode vir a ser frustrado pela ocorrência de alienação parental. O art. 2º da Lei nº 12.318/2010 prevê que se considera “ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”.

Vale estabelecer a diferença entre a alienação parental e a síndrome dela decorrente. A síndrome da alienação parental começou a ser delineada em 1985, pelo psiquiatra infantil Richard Gardner, que a definiu como abuso emocional daquele que exerce o poder parental sobre o infante (GARDNER, 1985, pp. 03-07). Nota-se que nem sempre a prática da alienação parental culmina no desenvolvimento da síndrome, vez que depende de uma série de fatores tais como a idade da criança e o grau de alienação que é praticado (FONSECA, 2006, p. 06). Ocorre que nos casos em que a síndrome de fato se instala e a criança passa a oferecer resistência a figura do genitor vítima da alienação, o restabelecimento da convivência durante a infância apenas é possível em cerca de 5% dos casos (FONSECA, 2006, p. 03), ou seja, é extremamente importante que o processo de alienação seja interrompido o quanto antes a fim de possibilitar que a convivência entre os entes familiares não seja prejudicada, e que a criança não chegue a desenvolver a síndrome que tem uma série de efeitos psicológicos com registros até na vida adulta.

A Lei de Alienação Parental refere-se ao direito à convivência familiar saudável, pois a prática da alienação parental, não obstante a regulamentação da guarda, ocasiona a quebra do afeto. “Como encontros impostos de modo tarifado não alimentam o estreitamento dos vínculos afetivos, a tendência é o arrefecimento da cumplicidade que só a convivência traz. Afrouxando-se os elos de afetividade, ocorre o distanciamento, tornando as visitas rarefeitas. Com isso, os encontros acabam protocolares: uma obrigação para o pai e, muitas vezes, um suplício para os filhos” (GARDNER, 1985, pp. 03-07).

Muito embora a própria lei sugira o uso de perícia psicológica ou biopsicossocial quando houver indício de alienação parental, demonstrando a necessária multidisciplinariedade no tema, muitas vezes os estudos sociais e psicológicos não são conclusivos, cabendo ao juiz decidir de acordo com o princípio do melhor interesse da criança. Nessa direção, o artigo 7o  da Lei de Alienação Parental fixa um critério de preferência na atribuição ou alteração da guarda,  para o genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada.

Sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, cabem as seguintes sanções pela prática de alienação parental, segundo a gravidade do caso, previstas no artigo 6º da Lei nº 12.318/2010:

I- declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;

II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;

III - estipular multa ao alienador;

IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;

V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;

VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;

VII - declarar a suspensão da autoridade parental.

 

Uma das consequências da alienação parental, embora possa ocorrer independentemente dela, consiste no abandono afetivo. Um dos pais aliena e o outro abandona, criando um círculo perverso contra o interesse do filho. O dever de cuidado cabe aos pais, conjuntamente, independentemente do modelo de guarda. Trata-se do dever de prover todos os direitos constitucionais da criança estabelecidos em síntese no art. 227, caput, da Constituição da República. O não cumprimento desse dever caracteriza o abandono, material, intelectual ou afetivo. O abandono material ocorre quando se deixa de prover a subsistência do menor sem justa causa. O abandono intelectual se verifica quando se deixa de garantir a educação fundamental sem justa causa. E o abandono afetivo se caracteriza pela ausência do convívio familiar saudável. O art. 1.638 do Código Civil estabelece como sanção para o pai ou mãe que deixa o filho em abandono a perda do poder familiar, por ato judicial. Discute-se também a reparação civil por dado causado em virtude de abandono afetivo.

Desse modo, mostra-se marcante a lógica punitiva, sancionatória, a regular as hipóteses de alienação parental e abandono afetivo. 

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça - STJ trouxe em destaque o esforço do Poder Judiciário para evitar danos decorrentes da alienação parental. Em caso citado, o pai agente de violência doméstica contra a mãe, teve garantido o direito à conviver com os filhos, em nítida percepção de que a relação parental não se confunde com a conjugal.

(http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/O-empenho-da-Justi%C3%A7a-para-evitar-os-danos-da-aliena%C3%A7%C3%A3o-parental).

Texto adaptado do artigo científico:  https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/quaestioiuris/article/view/38047

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Veja mais sobre histórico e a história dessas famílias:
https://30anos.stj.jus.br/2019/01/familia-sem-ressalvas-uma-conquista-social-alcancada-nos-tribunais...



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